Ser preso e levado ao presídio. Sair do cárcere, mas depois voltar ao sistema penitenciário. Essa era a realidade de 14.489 pessoas que se encontravam recolhidas em unidades penitenciárias cearenses em 2022, um número que representava 71% (ou 7 em cada 10) do total de presos ouvidos, que era de 20.408 pessoas, segundo o Censo Penitenciário 2023.
O Censo Penitenciário, que não era realizado no Ceará desde 2013, foi elaborado nos últimos dois anos em uma parceria entre a Universidade Federal do Ceará (UFC) e a Secretaria da Administração Penitenciária e Ressocialização do Ceará (SAP). Os dados foram coletados entre maio e julho de 2022 e consolidados durante o ano passado. 19.626 homens e 782 mulheres privados de liberdade foram ouvidos pelos pesquisadores.
Ao somar homens e mulheres, 27,2% dos presos (ou seja, 5.548 internos) já tinham uma reentrada no presídio; 20,2% (ou 4.130 presos) tinham duas reentradas; e 11,5% (2.346 detentos) tinham três reentradas. O percentual diminui conforme aumenta o número de retornos ao sistema. Até que um número de 138 presos (0,7% do total) afirmou que já esteve nos presídios entre 9 e 20 vezes.
O Censo Penitenciário traz que a reentrada no sistema é uma "indicação de processos de reincidência e descumprimento de medidas de liberdade condicional". Em entrevista ao Diário do Nordeste, a coordenadora do Censo e professora do curso de Enfermagem da Universidade Federal do Ceará (UFC), Ana Karina Pinheiro, detalha que "reentrada é o conceito adequado para a movimentação cotidiana das unidades prisionais que se caracteriza por saídas e entradas das pessoas", o que não significa obrigatoriamente uma reincidência no crime.
"As saídas podem ser por progressão de pena, evasão, transferência para cumprimento de pena em outra unidade, entre outros. Na mesma lógica, as entradas se dividem em entrada para cumprimento de pena, transferência de outra unidade prisional para cumprimento de pena, recaptura de foragidos, cumprimento de mandatos de prisão em aberto, entre outras. Assim, o conceito de reentrada contempla gama variada de situações de aprisionamento que extrapolam o fenômeno da reincidência criminal." Ana Karina Pinheiro
A criminalidade está presente na vida da maioria dos presos desde a juventude, segundo a pesquisa - o que fortalece a reincidência. O Censo Penitenciário revelou que 66,1% dos presos à época (um total de 13.495 internos) tinham cometido o primeiro delito antes de 21 anos; e 58,8% (12.002 presos) tinham sido detidos por um delito, pela primeira vez, antes dos 21 anos.
A professora Ana Karina analisa que "crianças e adolescentes são expostos a uma sociedade desigual, onde vários de seus direitos são violados. A proporção apresentada no censo demonstra claramente as imensas vulnerabilidades sociais que a população pesquisada enfrenta desde o nascimento".
"O primeiro crime na infância ou adolescência tem consequências pessoais, sociais e estruturais relevantes. Os indivíduos envolvidos com prática (criminosa) nesses períodos têm repercussões em sua vida e saúde, estão propensos a mortes precoces, prisões recorrentes, desistência às aulas, rompimento com o pacto social e as leis da cultura", acrescenta.
Fonte: DN