O Ceará terminou o ano de 2024 na liderança de rankings negativos na Segurança Pública: foi o estado do Nordeste com mais mortes de servidores da área, tanto por assassinatos como por suicídios. Ao total, 32 policiais das Forças de Segurança cearenses foram vítimas de crimes violentos ou tiraram a própria vida, no ano passado. Os dados foram coletados e divulgados pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP).
A Pasta do Governo Federal considera como "profissionais de Segurança Pública" os policiais civis, militares, penais, federais e rodoviários federais, bombeiros militares, peritos, guardas municipais e agentes de trânsito, a partir de dados fornecidos pelos estados e pelo Distrito Federal.
Conforme a estatística, o Ceará somou 17 mortes violentas de profissionais de Segurança Pública, em 2024. Foram 16 policiais militares e um guarda municipal assassinados. Esse número coloca o Ceará no 4º lugar entre os estados de todo o Brasil, atrás apenas do Rio de Janeiro, com 70 mortes; São Paulo, com 31; e Pará, com 23.
No Nordeste, o Ceará teve o maior número de crimes violentos com agentes de segurança como vítimas. Logo atrás, ficaram a Bahia, com 17 mortes; e Pernambuco, com 7. Na comparação com os anos anteriores, 2024 teve o maior número de homicídios de profissionais da Segurança, no Ceará, desde 2018 (em 2017, foram 28 mortes).
Neste ano de 2025, dois policiais já foram assassinados no Ceará por integrantes de facções criminosas. O subtenente PM Francisco Ricardo Silveira Neto foi morto a tiros e com uma facada, no Pirambu, no dia 15 deste mês. E o policial penal José Wendesom Rodrigues de Lima foi executado a tiros, no Centro de Fortaleza, na última terça-feira (28).
O sociólogo do Laboratório de Estudos da Violência (LEV) e professor da Universidade Federal do Ceará (UFC), Luiz Fábio Paiva, acredita que "uma sociedade violenta é violenta para todo mundo, sobretudo para o operador de segurança pública, que tem uma função onde há uma maior exposição aos efeitos das dinâmicas criminais e da violência".
"Em relação aos casos de violência contra policiais, que culminam na vitimização de policiais, nós temos que ter dois cuidados muito importantes. O primeiro, é preciso entender o contexto dessa violência. Eu preciso entender o que aconteceu em cada um desses casos, para que o Estado possa criar protocolos e criar ações que vão prevenir a violência contra esse operador de segurança pública", aponta o sociólogo.
Outra situação é que, independentemente do caso, identificado que há uma responsabilidade de terceiros nestes casos de violência contra policiais, é preciso que o Estado se mobilize por meio das instituições de Justiça para responsabilização. Isso é muito importante para evitar que outros policiais tomem a frente e criem outros problemas para a sociedade. É preciso um freio (aos criminosos), mas esse freio não pode ser dado pela motivação de outros policiais para criar situações de vingança, e sim pelo Estado, pelo trabalho de investigação, de inquérito, de processo e de responsabilização efetiva da Justiça aos indivíduos que cometeram esse tipo de violência."
Questionada sobre as mortes de policiais, a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará (SSPDS) informa, em nota, que "os crimes contra a vida de servidores das Forças de Segurança do Ceará ocorridos em Fortaleza são investigados pela 11ª Delegacia do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) da Polícia Civil do Estado do Ceará (PCCE), unidade especializada em investigar crimes dolosos contra a vida e latrocínios praticados em desfavor de agentes de segurança pública do Estado. Já as ocorrências em outras cidades ficam sob a responsabilidade das delegacias da região".
"A SSPDS e suas vinculadas Polícia Civil e Polícia Militar do Ceará (PMCE) reiteram ainda que não medem esforços para elucidar os casos, bem como identificar, localizar e prender os suspeitos das ações criminosas", destaca a Pasta, que acrescenta que "emprega todos os recursos disponíveis nas Forças de Segurança do Estado para capturar suspeitos de participação nos casos de CVLI (Crimes Violentos Letais Intencionais), bem como elucidar as circunstâncias dos crimes".
A SSPDS/CE destaca ainda que os profissionais da segurança são capacitados acerca de protocolos de sobrevivência policial em situações de riscos durante os períodos de folga. A iniciativa, denominada de Instruções de Táticas Individuais (ITIs), foi instituída em 2020 pelo comando-geral da PMCE. A capacitação tem o objetivo de orientar os PMs sobre como devem agir em ações preventivas, em procedimentos ao sair de casa, no manuseio de armas de fogo e algemas, posições táticas, além de orientações básicas e treinamentos voltados para técnicas de sobrevivência policial em veículos próprios e em deslocamento a pé."
Suicídios na tropa policial
O Ministério da Justiça e Segurança Pública recebeu dados de que 15 profissionais de Segurança Pública cometeram suicídio, no Ceará, em 2024. Foram 10 policiais militares, 2 policiais civis, 2 guardas municipais e 1 policial rodoviário federal. Esse número foi o maior da série histórica, desde 2015.
O Ceará ficou em 3º lugar no ranking de suicídios de agentes de segurança, em todo o Brasil, atrás apenas do Rio de Janeiro, com 18 mortes, e Rio Grande do Sul, com 16. No Nordeste, ficou em 1º lugar - Bahia e Pernambuco tiveram 5 mortes cada e ficaram em 2º lugar na região.
O advogado Werner Feitosa acredita que falta "suporte adequado à saúde mental desses profissionais". "Os policiais lidam diariamente com situações extremas de estresse, convivendo com eventos traumáticos e altos níveis de tensão durante o serviço. Esses fatores, quando somados a outras dificuldades estruturais, tornam-se um fardo insuportável para muitos", completa.
Segundo o advogado da ASSOF-CE, os policiais convivem com um "endividamento crescente", em virtude da perda do poder de compra e de empréstimos que precisam se submeter; e também sofrem com uma "carga horária exaustiva, muitas vezes intensificada por serviços extraordinários realizados na tentativa de complementar a renda", o que "acaba por privar os policiais de momentos de lazer e convivência familiar, que são fundamentais para manter o equilíbrio emocional".
O sociólogo Luiz Fábio Paiva concorda que os casos de suicídio na tropa policial também podem estar associados à exposição à violência do trabalho, mas pondera que os casos precisam ser analisados individualmente.
Fonte: DN